Entrevista publicada originalmente a 28 de março de 2015
O espaço-tempo começou há 13,8 mil milhões de anos, com o Big Bang; a luz (fotões), que possibilita a observação e a fotografia, soltou-se 0,000.000.000.01 segundos depois. A Terra formou-se há 4,6 mil milhões de anos, e a vida (primeira célula) começou há 3,8 mil milhões de anos. Reza o Génesis que “a Terra era informe e vazia, as trevas cobriam o abismo, e o espírito de Deus movia-se sobre a superfície das águas”. A Humanidade (Homo sapiens) nasceu em África há 200 mil anos. Os sete dias da Criação duraram, na verdade, a idade do Universo: 13,8 mil milhões de anos! Depois dos horrores e das tragédias que testemunhou no “Êxodos” — o seu anterior projeto, sobre as migrações e os campos de refugiados, as guerras e a fome em África, o conflito de terras e a urbanização caótica na América Latina e as novas megalópoles asiáticas —, Sebastião Salgado recuperou a esperança ao fotografar a Terra naquilo que ela ainda tem de mais puro e belo. “Génesis” é a sua “declaração de amor à Natureza”. Conhecemo-nos há quase 30 anos: contactei-o em 1987, quando fui encarregado pela Secretaria de Estado da Cultura de formar a Coleção Nacional de Fotografia. É graças à generosidade de Sebastião Salgado que a Coleção conta com dez fotografias suas (da Revolução de 25 de Abril e dos projetos da Serra Pelada, Sahel e “Outras Américas”). Desta vez encontrámo-nos no nordeste de Paris, à beira do canal Saint-Martin, na sua casa e sede de Amazonas Images, a agência que fundou em 1994 com a sua mulher, Lélia, depois de sair da Magnum. Uma longa conversa, regada pelo rescendente café brasileiro Dutra (das matas de Minas Gerais), moído à mão numa máquina artesanal do tempo dos nossos avós.
“Génesis” cobre as quatro coordenadas cardeais, da Antártida ao norte da Sibéria, da Papua-Nova Guiné ao Grand Canyon. Quais os objetivos desta aventura global?
Quando comecei este projeto quis ir ver e fotografar o nosso planeta naquilo que ele tem de mais puro e pristino. Com o projeto ambiental do Instituto Terra que temos no Brasil, eu e a Lélia ficámos muito próximos da Natureza. Chegara o momento de eu conhecer o planeta. Nunca tinha fotografado paisagens, nunca tinha fotografado aquilo a que chamava as “naturezas-mortas” das montanhas, das árvores, flores e frutos, dos outros animais. O meu agente alertou-me: “Você vai correr o maior risco da sua vida. É conhecido como um fotógrafo social e humanista, fotografou até aqui apenas a condição humana… E agora como vai fazer?”