Aguiar-Branco: “Espero que as presidenciais não se transformem num debate antipartidos”



O presidente da Assembleia da República afirma esperar que as eleições presidenciais não tenham como alvo os partidos políticos e que o próximo chefe de Estado respeite o parlamento e saiba interpretar os seus poderes constitucionais.

Na entrevista à agência Lusa, José Pedro Aguiar-Branco não se pronunciou sobre as candidaturas do almirante Gouveia e Melo ou do antigo líder do PSD Luís Marques Mendes. Reiterou, porém, a sua ideia de que a questão das presidenciais foi colocada cedo demais no debate político.

Sobre a próxima campanha para as eleições presidenciais deixou um recado: “Gostaria que o debate das presidenciais não se transformasse num debate antipartidos, porque os partidos políticos são fundamentais e estruturantes numa democracia, são fundamentais numa democracia liberal representativa”.

O antigo ministro social-democrata alerta para os “perigos” da democracia direta, através de redes sociais ou de outras formas de comunicação “sem filtro”, e contrapõe que os partidos ou os movimentos “são absolutamente críticos e vitais para uma democracia”.

“Tudo o que seja um discurso antipartidos é perigoso para a democracia. Desejava que as presidenciais não se transformassem num debate antipartidos, que acho perigoso para a própria democracia”, reforça.

Interrogado sobre o que espera de um próximo Presidente da República em termos de leitura dos seus poderes constitucionais, Aguiar-Branco fez questão de sublinhar a natureza semiparlamentarista ou semipresidencialista do regime português.

“O foco no parlamento é um foco muito importante no nosso regime. Pessoalmente, adiro a essa dimensão da importância do parlamento, da representação plural e do poder que [dele] emerge ser um poder que tem de ser tido em conta por qualquer outro órgão de soberania”, adverte.

E conclui: “O Presidente da República tem um especial dever e cuidado – e assim acredito que será – de ter esse respeito por outro órgão de soberania, e no caso concreto o parlamento. É do parlamento que emana a dimensão de Governo a que estamos habituados e que acho que é saudável para a nossa democracia”.

Presidente do parlamento vai ser das funções mais exigentes do regime

José Pedro Aguiar-Branco afirma também que se recandidata às funções que ainda exerce para procurar concluir matérias que considera importantes e que foram interrompidas, como a reforma da justiça e as iniciativas para aproximar o parlamento dos cidadãos.

“Acho que a função de presidente da Assembleia da República talvez seja neste momento das mais exigentes no que diz respeito ao próprio regime democrático, porque tem uma dimensão conceptual, mas tem também uma dimensão operacional. É no parlamento que se têm de fazer consensos e criar maiorias, que se tomam medidas que depois impactam na vida dos cidadãos e se faz o escrutínio da ação do Governo – isto é nuclear no que diz respeito à qualidade do regime democrático”, adverte.

José Pedro Aguiar-Branco diz mesmo sentir “essa responsabilidade sobre os ombros”. 

Salienta que a vontade popular resultante das eleições tem de ser respeitada, que a democracia portuguesa não estabeleceu uma maioria constitucional definitiva e antevê maiorias de geometria variável na próxima legislatura.

Estas posições sobre o quadro político da nova legislatura resultante das eleições legislativas antecipadas foram defendidas por José Pedro Aguiar-Branco em entrevista à agência Lusa.

Interrogado sobre o crescimento eleitoral do Chega e o fim da maioria constitucional de dois terços entre PSD e PS, o presidente do parlamento considera que tal “obriga a um exercício maior de esforço de consensualização” para a nomeação de personalidades para cargos como os juiz do Tribunal Constitucional, Provedor se Justiça ou de presidente do Conselho Económico e Social.

Incompatibilidades e remunerações dos políticos

O presidente da Assembleia da República considera que há um problema muito sério com o recrutamento de cidadãos qualificados para a política e pede coragem para se rever os estatutos remuneratório e de incompatibilidades dos políticos.

“É preciso ter coragem de colocar sem demagogia no debate político matérias que são impactantes para a nossa democracia — e é saudável que haja ideias diferentes sobre o tema”, defende José Pedro Aguiar-Branco em entrevista à agência Lusa.

O presidente do parlamento fez questão de distinguir os estatutos remuneratório e de incompatibilidades da existência de um registo de interesses rigoroso.

“Acho que é importante o registo de interesses e conflito de interesses que devem ser referenciados. E se houver uma violação desse registo de interesses deve haver uma punição. Uma punição que deve ser célere e suficientemente forte para que essa violação do conflito de interesses seja realmente sancionada”, começa por assinalar.

Porém, o antigo ministro social-democrata manifesta-se contra a complexidade inerente ao atual regime de incompatibilidades aplicado aos titulares de cargos políticos. Alega que alguém que tenha mérito na sociedade vê-se impossibilitado de entrar na política, porque “é inspecionado o tio, o primo, a sobrinha”.

“Chega-se a situações de suposta fiscalização que acaba por ter um efeito perverso”, porque afasta da atividade política cidadãos com “mérito profissional, ou com mérito social”, ou, ainda, pessoal com “capacidade de influência boa”, alerta.

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